Dentre todas as áreas de auditoria, a contábil é a mais conhecida e aplicada, sendo entendida por muitos como a mais eficiente, por visar o diagnostico de fraudes e a diminuição dos gastos. Contudo, na opinião de Barquette, apesar de sua grande importância na gestão, se utilizada isoladamente não é suficiente para alcançar o sucesso do negócio, uma vez que não atinge outras áreas da empresa. (BARQUETTE, 2008).
Para Crepaldi a auditoria contábil, embora importante, sofre muitas limitações, não sendo possível afirmar que ela torna impossível a ocorrência de erros e fraudes, mas tão somente, que reduz a possibilidade de ocorrência. Na opinião do autor, para que a eficiência dessa auditoria fosse total seria necessário a realização de uma revisão integral de todos os registros da empresa, bem como, a fiscalização de todos os atos dos funcionários e administradores, algo impraticável. (CREPALDI, 2012).
Em contrapartida, as auditorias jurídicas têm se ampliado e de tal forma que não escapam de sua apreciação a área administrativa, financeira, comercial, operacional, regulatória, trabalhista8, tributária, ambiental, entre outras.
As auditorias jurídicas, inicialmente, eram muito utilizadas com o objetivo de detectar fraudes e nos processos de fusão, aquisição de empresas e reorganização societária (due diligence). Com efeito, atualmente, teve seu conteúdo alargado, assumindo uma importância ainda maior em relação às atividades desenvolvidas pela empresa, contudo, focada no caráter preventivo, contribuindo especialmente na tomada de decisões pelo gestor e na gestão de riscos. (BORTOLI, 2008).
Barquette explica que a utilização da auditoria jurídica, sobretudo, a preventiva constitui estratégia muito importante na gestão de uma empresa, pois através dela podemos apurar falhas muitas vezes inevitáveis, mas sanáveis. Além do que, proporciona a oportunidade de aprender sobre a origem de eventuais problemas. (BARQUETTE, 2008).
Com o uso dessa estratégia, a empresa poderá descobrir, analisando o relatório final, se os princípios básicos do direito empresarial – que podem, inclusive, estar expostos explicitamente como metas e diretrizes da empresa -; estão ou não sendo seguidos e aplicados. Dessa forma, a auditoria jurídica poderá servir como proteção da corporação com a apuração dos riscos, dos interesses do setor, e o reconhecimento cuidadoso das fraquezas e dos pontos fortes. A meta é minimizar as perdas impostas pelo mercado e os riscos decorrentes do exercício da atividade empresarial, a partir de um pensamento jurídico estratégico e concatenado com as estratégias gerais da empresa. (BARQUETTE, 2008, p.6854).
Na auditoria jurídica será realizada uma análise do patrimônio da empresa, do seu sistema operacional e de todos os processos administrativos e judiciais, principalmente aqueles com expressivo volume de demandas, a fim de se realizar o levantamento, detecção e análise de ativos e passivos, bem como, todas as demais contingências de natureza legal. (BORTOLI, 2008).
Frederico de Andrade Gabrich relaciona alguns documentos que podem ser analisados em uma auditoria jurídica:
a) instrumentos de constituição jurídica das pessoas (contratos e estatutos sociais, registros da pessoa na Junta Comercial e/ou no Cartório de Registro Civil das Pessoas Jurídicas); b) contratos celebrados com empregados, prestadores de serviços, fornecedores e clientes; c) processos judiciais e extrajudiciais em curso; d) certidões negativas ou positivas com efeito de negativas (fornecidas pela Justiça Estadual, Justiça Federal, Justiça do Trabalho, Cartórios de Protestos); e) certidões de registro e/ou propriedade de bens móveis e imóveis, corpóreos e incorpóreos (marcas, patentes e bens de propriedade intelectual). (GABRICH, 2008, p. 4761).
A partir desses entendimentos, verificamos que a auditoria jurídica tem como finalidade, identificar as irregularidades jurídicas e informá-las aos gestores, avaliar ativos e passivos e indicar medidas de diminuição dos riscos jurídicos, de modo a garantir a adequada segurança jurídica dos negócios da empresa. (BORTOLI, 2008).
Em suma, a auditoria jurídica objetiva identificar irregularidades existentes e corrigi- las, bem como, identificar medidas preventivas para evitar possíveis irregularidades. Nesse sentido, Bortoli explica que realizada a auditoria jurídica e identificada irregularidades, as providências tomadas a partir dai devem ser concentradas em corrigir os problemas.
as medidas devem se concentrar em corrigir o problema, e não apenas os sintomas, por isso, as orientações corretivas ou preventivas de riscos jurídicos poderão indicar mudanças nas políticas da empresa, mudança de cláusulas em contratos que envolvam terceirização de serviços, orientações de controle operacional (diretamente relacionados com riscos jurídicos), mudança de estratégias processuais, orientação para tentativa de acordo em processo com poucas chances ou sem chances de êxito, entre outras medidas.( BORTOLI, 2008, p. 183).
Contudo, ressalta que uma vez indicada a ‘possível solução’ a decisão sobre adotar as medidas corretivas encontradas não é auditor jurídico, mas da diretoria ou dos encarregados da tomada de decisão. (BORTOLI, 2008).
Na execução das atividades é importante que a contratação da auditoria jurídica seja precedida de regras de sua realização. Ademais, é indispensável que o auditor jurídico contratado seja um profissional experiente, com conhecimento amplo e atualizado. Bortoli explica que auditor jurídico precisa ter noções de contabilidade, economia, administração e tem que estar disposto a entender sobre a atividade operacional da empresa. (BORTOLI, 2008).
Na execução das atividades de auditoria jurídica, é imprescindível, ainda, que o auditor jurídico adote padrões de conduta ética; respeito e responsabilidade; bom senso no procedimento de revisão e sugestão; autoconfiança; discrição e sigilo profissional; independência; capacidade prática, finura de trato e humanidade.
Em síntese, a função do auditor jurídico deve estar pautada e estruturada “pela ética, pelos valores humanos e pela normatividade”. (BARQUETTE, 2008, p.6850).
Roso, ao tratar a questão ética do auditor jurídico, explica que:
O advogado, quando exerce auditoria, na verdade, deve fazer valer os altos desígnios de seu mister, de modo que o Direito possa servir à democracia e seu destino, na busca da felicidade pessoal. No exercício da auditoria, não pode haver tolerâncias
nas regras éticas. Nem mesmo se deve aceitar qualquer leniência. (ROSO, 2001, p. 89).
A adoção desses padrões de conduta ética é indispensável, não apenas porque o auditor jurídico deve “servir de exemplo” e fazer-se “merecedor de respeito”10, mas principalmente, porque em caso de condutas inadequadas poderá ser responsabilizado civil e criminalmente pelos atos praticados. 11
Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme ao tratar da responsabilidade civil do auditor jurídico, explica que esse será responsabilizado pelos erros de fato e de direito que cometer no desempenho do mandato ou contrato, que prejudiquem o cliente e terceiros:
Este profissional será responsabilizado: (I) pelos erros de fato que cometeu no desempenho da função advocatícia; (II) pelos pareceres, desde que contrários à lei, à jurisprudência e à doutrina, não somente pelo fato de ter erros de digitação ou por ser um parecer com conselho absurdo, mas pelo fato de estar errado ou por ter agido imprudentemente, pois o advogado deverá pesar as consequências ou os danos causados pela inexatidão do parecer dado; (III) pela omissão de dados, conselhos no parecer emitido, fazendo com que a empresa perca direito ou obtenha resultado desfavorável ou prejudicial quando poderia ter-lhe fornecido dados que a permitissem enveredar por um caminho vitorioso; (IV) pelo dano causado a terceiro, embora excepcionalmente. Será responsabilizado pelos atos que danificarem terceiros, mesmo que não seja objeto do contrato entre cliente e auditor jurídico. Portanto, o advogado deverá indenizar prontamente o prejuízo que vier a causar por negligência, erro irrecusável ou dolo. (GUILHERME, 2005, p. 140).
As normas que dispõem sobre os deveres e responsabilidades do advogado estão elencadas nos arts. 186 e 927 do Código Civil Brasileiro12, no Estatuto da Advocacia (Lei n° 8.906/94) especificadamente nos arts. 34 a 43, no Código de Ética e Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil e no Código de Defesa do Consumidor13. Sendo o trabalho de auditoria jurídica prestado por uma sociedade de advogados essa responsabilização se estenderá, também, aos sócios.
Fonte: http://www.publicadireito.com.br – Terceiro capítulo do texto de Gleice Leila Barral