Entenda a inversão da curva de juros e demais fatores que sinalizam uma recessão
Questões como desaceleração econômica global, disputa comercial entre Estados Unidos e China, política na Argentina, dentre outras, acabaram aumentando o receio de uma recessão econômica mundial, sobretudo nos Estados Unidos.
Na quarta-feira passada (14), outro fenômeno acabou por intensificar as preocupações: A inversão na curva de juros dos títulos dos Estados Unidos.
Os rendimentos pagos pelos títulos do tesouro americano de 10 anos passaram a ser menores do que os rendimentos dos títulos de 2 anos, fenômeno conhecido como ‘inversão da curva de juros’.
Se os títulos de 10 anos estão com rendimentos abaixo dos títulos de 2 anos, isso sugere que a expectativa é que a economia americana não cresça ou cresça pouco no longo prazo. Deveríamos concluir que títulos de longo prazo têm maior rendimento em função da imprevisibilidade da economia em 10 anos, ou seja, maior risco.
Ao contrário do que muitos têm dito, o que está ocorrendo não é uma previsão garantida de recessão econômica. Nos últimos anos o fenômeno da inversão da curva de juros sinalizou, em alguns casos, baixo desempenho econômico mais adiante, porém, somente em alguns casos.
As curvas de juros dos títulos americanos já vinha sinalizando uma inversão pela desvalorização dos títulos de 10 anos, considerado um dos ativos mais seguros do mundo. A última vez que esse fato ocorreu foi em 2006 e tempos depois viria ocorrer a crise do Subprime em 2008. Há analistas que calculam um tempo médio de 22 meses entre a inversão das curvas e uma possível recessão.
Veja no gráfico o momento da inversão em 14/08 e o atual momento, com a inversão anulada:
A tal inversão acontece novamente em meio a sintomas de desaceleração econômica nos EUA e em todo o mundo, após uma onda de injeção de liquidez pelos bancos centrais, e agora agravadas pela disputa comercial entre americanos e chineses.
Os cortes de juros
No mês passado o Banco Central Americano (FED) cortou os juros em 0,25% e a expectativa de alguns especialistas para a próxima reunião é de um novo corte de 0,25%. Inclusive, há uma pressão dos mercados e do próprio presidente americano, Donald Trump, sobre o FED para novos cortes nas taxas de juros.
Um dos objetivos com cortes nas taxas de juros é incentivar o consumo dos cidadãos, o que pode ser a intenção do FED para o momento, porém suas prioridades são manter baixo os índices de desemprego e a inflação que gira em torno de 2% atualmente. O FED também sinalizou que pode não haver outros cortes nos juros, a não ser que o cenário corporativo piore a ponto de gerar demissão em massa de empregados.
A projeção da economia americana divulgada no 1º trimestre superou as expectativas dos analistas para um crescimento anualizado de 3,2% do PIB; já no 2º trimestre o cálculo para o ano foi de um incremento de 2,1% – difícil imaginar uma recessão a curto prazo, com um crescimento econômico como esse.
A título de comparação, o Brasil tem um crescimento projetado para o PIB em 2019 de apenas 0,83%, de acordo com as últimas divulgações do Relatório de Mercado Focus do Banco Central.
Portanto, embora as notícias tenham sido alarmantes, esse cenário retrata que a curto e médio prazo o crescimento da economia americana pode ser menor do que o esperado, porém ainda distante de uma recessão de fato.
Em suma, a inversão da curva de juros é apenas uma das maneiras de se medir a possibilidade de recessão, porém, existem outras maneiras mais eficientes ou, no mínimo, complementares como por exemplo o cálculo do Debt Service Ratio (DSR) – Taxa de dívidas de serviços – nesse caso, do setor privado não financeiro.
Debt Service Ratio – DSR
O DSR é uma medida das restrições financeiras impostas pelo endividamento e calcula pagamento de juros e amortização de débitos proporcional ao PIB – pode ser entendido como uma análise de risco financeiro entre crédito e PIB.
Na prática o cálculo do DSR é usado por credores financeiros, como regra geral, para determinar a proporção da receita que já é gasta no pagamento das dívidas, e no caso de países, o cálculo é proporcional ao PIB.
Um DSR alto pode sinalizar uma alteração negativa nos índices de consumo e também nos investimentos, mesmo em um cenário de crescimento econômico. O DSR também provou ser um indicador de alerta altamente confiável em casos de crises bancárias, servindo como um complemento à medição dos índices de alavancagem.
O Bank for International Settlements (BSI) em um dos seus relatórios, descreveu que a relação entre uma inversão na curva de juros e uma possível recessão econômica tem perdido força como sinalizador. O Banco argumenta que os ciclos financeiros apresentam mais impacto e relevância na economia de um modo geral. Dessa forma, o DSR seria o indicador mais efetivo para avaliar o risco de uma recessão.
O cálculo do DSR conseguiu medir precisamente com dois ou três anos de antecedência as últimas crises econômicas nos EUA e nos demais países. Note no gráfico abaixo os períodos que precederam as crises “Dot com” em 2002 e “Subprime” em 2008, com picos do DSR.
Antes de 2008 o DSR do setor privado não financeiro nos Estados Unidos cresceu em uma velocidade muito maior do que os níveis atuais. Saiu em junho/2004 de 15,6% para 18,3% em janeiro/2008, ou seja, cresceu 2,7% em 3 anos e meio.
Atualmente, a taxa do DSR cresceu apenas 1% em 3 anos e 3 meses de setembro/2015 a dezembro/2018 – último período divulgado.
Com essas informações é possível perceber que os níveis atuais ainda não indicam alto risco de recessão ou, pelo menos, não nos níveis de 2008.
Concluindo, o investidor consciente deve observar indicadores, fatos e opiniões diferentes ou complementares para tomada de decisão em seus investimentos.
O auxílio de um profissional capacitado pode contribuir com a ótica do investidor sobre o mercado e também com direcionamento de seus investimentos em momentos de tensão ou euforia.
Fonte: Andrade Câmara Advocacia & Consultoria Patrimonial